CABO DELGADO: ANALISTAS CRITICAM SILÊNCIO SOBRE ATAQUES

Analistas moçambicanos criticam o silêncio oficial sobre novos ataques em Cabo Delgado, alertando para a falta de transparência do Governo e a continuidade da violência insurgente na região.

Analistas moçambicanos criticaram hoje a falta de informação oficial “clara e transparente” do Governo sobre novos ataques armados na província de Cabo Delgado, mas consideram que não se trata do recrudescimento do extremismo, porque acontece de forma “contínua”.

João Feijó, pesquisador do Observatório do Meio Rural (OMR), Organização Não-Governamental moçambicana, disse à Lusa não se tratar “propriamente” do recrudescimento de ataques em Cabo Delgado, tendo em conta a situação vivida no terreno desde finais de julho, já que estes acontecem de uma forma “contínua”, ao longo dos últimos oito anos, e de forma “mais ou menos intensa”. 

“A novidade está em terem entrado na vila sede de Mocímboa da Praia e terem realizado ataques e decapitações nessa zona e o facto de ser numa zona onde existem aquartelamento de ruandeses”, afirmou o especialista, que já realizou vários trabalhos sobre a situação em Cabo Delgado.

Os ataques e movimentos extremistas, intensificados nas últimas semanas, para o analista, servem para promover assaltos, obter comida para as bases dos insurgentes, exercer pressão, “mostrando que estão ativos”, além de provocar “terror”, desestabilizar socialmente o território e levar a população a culpar o Estado pela falta de segurança, provocando um “desgaste” no tecido social.

“A mensagem [dos terroristas] talvez seja: nós estamos aqui, nós existimos. Ao mesmo tempo, conseguem demonstrar a incapacidade das Forças de Defesa e Segurança de protegerem a população”, acrescentou Feijó.

Por sua vez, o sociólogo moçambicano Elísio Macamo criticou a falta de informação oficial: “Não há informação oficial clara e transparente, a partir das autoridades moçambicanas, sobre o que realmente está a acontecer”.

Para o académico, a falta de informações sobre os recentes ataques na província de Cabo Delgado, que enfrenta a insurgência armada desde 2017, demonstra uma “aparente indiferença” em relação à insegurança que se vive na região e à ameaça a soberania do país, apontando também para o “despreparo” das autoridades.

“Eu considero muito estranho que até hoje, volvidos nove meses, o Governo ainda não se tenha pronunciado, nem que fosse para apenas corrigir a falta de respeito demonstrada pelo anterior Governo, ao não ser transparente em relação à presença de tropas estrangeiras [em Moçambique]”, acusou.

A província de Cabo Delgado, rica em gás e que sofre ataques desde 2017, regista um recrudescimento de ataques de grupos rebeldes desde julho, tendo sido alvos os distritos de Chiúre, Muidumbe, Quissanga, Ancuabe, Meluco e mais recentemente Mocímboa da Praia, provocando desde então dezenas de milhares de deslocados.

O Governo moçambicano lamentou na terça-feira da semana passada os ataques terroristas registados nos últimos dias em Cabo Delgado, referindo que é papel do Estado perseguir, retardar e travar os ataques para que a população tenha “menos sofrimento possível”.

Só em 2024, pelo menos 349 pessoas morreram em ataques, no norte de Moçambique, a maioria reivindicados pelo grupo extremista Estado Islâmico, um aumento de 36% face ao ano anterior, segundo um estudo divulgado pelo Centro de Estudos Estratégicos de África (ACSS), uma instituição académica do Departamento de Defesa do Governo norte-americano.

Atualmente, Moçambique e Ruanda cooperam, principalmente, na área militar com uma força de mais de dois mil militares ruandeses no combate desde 2021 aos grupos extremistas que operam naquela província do norte do país, protegendo nomeadamente a área em que a francesa TotalEnergies está a instalar um megaprojeto de gás natural, após acordo entre os dois governos.

A presença ruandesa começou a ser reforçada em abril de 2024, na sequência da saída progressiva da missão militar dos países da África austral.

Fonte: DW

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